segunda-feira, 4 de maio de 2009

Que grande palhaçada....



Será que é realmente necessário haver animais num circo? Não haverá outra maneira de entreter as pessoas senão humilhar os animais? E a sua dignidade, quem a defende?
São estas algumas das questões que a Professora Martha C. Nussbaum faz levantar quando refere as péssimas condições em que os animais do circo vivem. Por fora, no mundo do espectáculo, na grande arena no centro do circo, eles surgem reluzentes, saudáveis e felizes. Porém, por detrás das cortinas, muitas vezes os animais são mal tratados. Já não é a primeira vez que se vê e ouve falar de casos em que eles são acorrentados, por vezes enfiados em grande número em pequenas caixas ou jaulas e algumas vezes sem comida suficiente. Martha Nussbaum acredita que os seres não humanos devem ter direito a uma existência digna, devem ter condições de vida equivalente à do Homem.
Muitas vezes, quando se fala em Direito dos Animais, pensa-se nos animais domésticos. “Porque é que o meu cão há de ter mais direitos do que eu, se não faz mais nada a não ser comer e dormir?”. Esquecem-se contudo que há animais fora do confortável lar. Por um lado os animais do mundo do espectáculo, por outro, os animais no mundo selvagem.
Relativamente a este tema, há inúmeras posições doutrinárias.
O nosso ordenamento jurídico considera os animais como “algo entre as coisas e os humanos”. Isto porque os integra na categoria das coisas, ao enviar para essa categoria tudo o que não é coisa imóvel, segundo o artigo 202º, 204º e 205º do Código Civil. Porém, há diversas situações no Código, em que há uma distinção entre animais e coisas, tal como indica o artigo 1323º.
Explorando outros ordenamentos jurídicos, como por exemplo o alemão, verificam-se outros planos ideológicos. O Dr. Hans Paul Prümm, na sua obra Umweltschutzrecht (Direito da defesa do ambiente), considera que a protecção dos animais está defendido na Lei Federal Ambiental (§ 20 e seguintes do Bundesnaturschutzgesetz), assim como um regulamento próprio sobre a tutela de cães vadios. Existe igualmente uma Lei de Tutela dos Animais, onde se entende que se deve preservar a vida e bem-estar dos mesmos. De igual forma, “sem que haja uma justificação coerente não podem ser causados aos animais qualquer tipo de dor, sofrimento ou danos”. Refere igualmente o princípio da “protecção ecocêntrica dos animais”, ou seja, os animais devem ser protegidos pela sua própria vontade e não por causa da vontade do Homem.
André Langeney considera que “O Homem partilha com os animais tudo o que respeita às emoções, à efectividade, à atracção sexual, aos cuidados, aos jovens, à solidariedade social, com a diferença essencial da linguagem”.
A Professora Nussbaum parece seguir este entendimento, pois verifica uma dignidade inexistente nos animais circenses. Ao considerar que as condições destes animais são péssimas, “apertados em jaulas imundas, esfomeados, aterrorizados e agredidos, indica que é obrigatório proteger estes animais. Efectivamente, os “protagonistas” só recebem os cuidados mínimos necessários que façam com que estejam apresentáveis no dia seguinte na arena. Penso que para garantir o sucesso de uns não se deve prejudicar a vida dos outros, nem tão pouco dos animais. Embora não sejam pessoas e como tal não têm a mesma dimensão racional e social, penso que isso não é o suficiente para não tutelar a sua posição. Doutrina considera que eles têm sentimentos, faltando-lhes a razão (não sendo capazes de direitos e obrigações), não tendo a noção do bem e do mal, não lhes podendo impôr preceitos de lei e esperar que estes os cumprem. Não têm liberdade e inteligência ao nível humano. Prova disso é o facto de segundo o Código Civil, a responsabilidade de danos causados por estes cair sobre os donos. A Convenção Europeia para a Protecção dos Animais de Companhia 13/93 de 13 de Abril conclui que eles são merecedores de tutela jurídica.
Na opinião de Martha Nussabum, a “existência digna” devia incluir oportunidades adequadas a nível nutritivo e físico, libertação de dor, tortura e crueldade, interacção com animais da mesma espécie em vez de trancados numa jaula e acima de tudo viver da maneira como é suposto uma animal da sua espécie viver e não sob circunstâncias de medo. Na opinião desta professora os animais devem “ter a oportunidade de apreciar a luz e o ar em tranquilidade”. Por um lado percebe-se que neste caso em concreto o circenses necessitem dos animais para trabalhar. Nada consegue trazer mais audiência que os palhaços e animais, visto que o público-alvo são as crianças. Muitas vezes os cartazes dos circos trazem animais na capa: “Venha ver o magnífico Leão Branco”, entro outras. Claro que é tudo uma questão de publicidade, pois na realidade por vezes nem sequer se trata de um leão... Por outro lado, como é natural, nada permite que os animais sejam mal tratados. Como tal, na minha opinião os animais devem ser excluídos dos programas de circo. Nada dá o direito ao Homem de ser aproveitar da vida de seres para fazer lucro. Se querem ser entretidos, que usem as suas capacidades e não recorrer a “truques e malabarismos” de animais, quando para conseguir tal se for preciso arrancam unhas ou dentes aos mesmos. Não serão eles capazes de se entreterem com os seus próprios atributos e capacidades? Um exemplo disso é o mundialmente conhecido “Cirque du Soleil”, onde os únicos artistas são os seres humanos.
Por fim, a Professora Nussbaum toca no ponto crucial: “O facto de que os humanos actuam em maneiras que façam destituir a dignidade aos animais parece-me um problema urgente de justiça (...) não me parece que haja qualquer boa razão porque é que os mecanismos da justiça e da Lei não podem ser estendidos através da barreira das espécies”. Neste ponto, parece-me que a professora pretende que haja mais e melhor legislação que proteja os animais. No caso português por exemplo, os animais deviam de ter um regime que os diferenciasse das coisas. Um bom passo para o conseguir foi através da Declaração Universal dos Direitos Animais, uma proposta de diploma legal internacional, levado por activistas da causa pela defesa dos direitos animais à UNESCO em 15 de Outubro de 1978, em Paris, e que visa criar parâmetros jurídicos para os países membros da Organização das Nações Unidas.
Em Portugal, a Liga Portuguesa dos Direitos do Animal segue os fins anteriormente visados. Merece a pena uma visita ao site oficial, em http://www.lpda.pt/. Neste site encontra-se o por enquanto único diploma nacional que regula de certa maneira o regime dos animais, a Lei 92/95 de 12 de Setembro.
Na minha opinião penso que o pensamento da professora Nussbaum deve ser seguido. Não me parece viável que o Homem possa deter a patrimonialidade sobre os animais. Efectivamente, o que nos distingue dos animais é a razão. Muitos zoólogos equiparam a nossa “razão” ao “instinto” dos animais. Há uma certa razão nisso, pois colocando cada um no seu meio, cada um é vencedor. Porém, ao trocar o ambiente em que se insere, um é refém do outro. O animal fora do seu habitat é como um brinquedo para o homem: colocam-se vestimentas neles, vão-se a concursos de beleza animal, entre outros. O Homem, sem armas nem tecnologia, não conseguiria sobreviver na selva nem na savana, no habitat natural protegido dos animais.Sou portanto da opinião da professora Nussbaum. Embora os animais não possam ter direitos, vistos que não são titulares de relações jurídicas, pois não têm personalidade e capacidade jurídica, nem são susceptíveis de estabelecer negociações, penso que não é motivo suficiente para lhes ser negada a dignidade. Como tal, os animais deviam ser proibidos nos espectáculos de circo ou de qualquer outro tipo de entretenimento que lhes possa causar qualquer tipo de sofrimento ou maus tratos e que possam afectar a sua dignidade animal.