quarta-feira, 6 de maio de 2009

Objecto Direito Ambiente

No nosso ordenamento jurídico o ambiente é amplamente tutelado, surgindo com uma dupla relevância a nível constitucional: relevância objectiva, como tarefa fundamental do estado (artigo 9º f), e) CRP), e subjectiva, como direito fundamental (artigo 66º CRP). Esta protecção ambiental é depois concretizada numa série de diplomas, dos quais se destaca a Lei de Bases do Ambiente.
Assim, é facto assente que o ambiente é um valor protegido pelo ordenamento português; do que trataremos agora é do que se entende por ambiente para efeitos desta protecção, o que é que se está aqui a tutelar, ou seja, qual é o objecto do Direito do Ambiente.

A resposta a esta pergunta depende de uma prévia opção do ordenamento por uma concepção antropocêntrica ou ecocêntrica da questão ambiental.
A lógica antropocêntrica centra a questão ambiental no Homem, não vê a natureza como um bem em si mesmo, assim esta deve ser protegida apenas na medida das necessidades do Homem. Nos termos desta concepção faz sentido uma noção ampla de ambiente, uma tutela ambiental que abranja um grande conjunto de matérias, muito para além das simples componentes ambientais naturais, unificadas em torno da finalidade de preservação do ambiente. Não tendo a natureza uma valência própria e estando sempre dependente das necessidades humana, também não se justifica para ela uma disciplina jurídica autónoma, devendo pelo contrário ser abrangidos todos os assuntos conexos, que têm a referida finalidade como denominador comum.
Pelo contrário, na lógica ecocêntrica o ambiente deve ser protegido como um valor em si mesmo, independentemente das necessidades Humanas, a natureza tem segundo esta concepção um valor intrínseco merecedor por si só de tutela jurídica.
Subjacente a esta visão esta uma concepção mais restrita da protecção ambiental, que reduz o objecto do direito do ambiente ao seu núcleo duro, as componentes ambientais naturais. Ao valer por si próprio, o ambiente merece uma tutela jurídica absolutamente autónoma, independente de qualquer factor humano.


O artigo 5º nº2 a) da LBA adianta-nos uma definição de ambiente como o conjunto dos sistemas físicos, químicos, biológicos e suas relações e dos factores económicos, sociais e culturais com efeito directo ou indirecto, mediato ou imediato, sobre os seres vivos e a qualidade de vida dos homens. E os artigos 6º e 17º da mesma lei dizem-nos expressamente que esta noção de ambiente abarca um conjunto de componentes ambientais não só naturais mas também humanas.
Olhando agora para a CRP podemos verificar que esta concepção de ambiente que abarca também componentes ambientais humanas bebe da fonte do artigo 66º. Com efeito este artigo aponta para mais do que a protecção apenas dos recursos naturais. Desde logo a epígrafe do artigo relaciona ambiente e qualidade de vida, o nº 1 do artigo refere o direito a um ambiente de vida humano e sadio, e as alíneas do nº 2 (nomeadamente alíneas a, b, e) levam-nos também para o campo das componentes humanas.
Não deixa de ser verdade que há também alguns factores que apontam para a tutela apenas das componentes naturais, como por exemplo os artigos 278º a 282º CP que distinguem nalguns desses artigos uma protecção directa dos recursos naturais, e noutros uma protecção indirecta através de outros bens jurídicos autónomos, como a saúde humana.

Pondo os pratos na balança parece-me claro que, no ordenamento português, esta pesa mais para o lado de uma noção ampla de ambiente, como o conjunto dos recursos naturais e das actuações humanas que têm a natureza como suporte e enquadramento (nas palavras da Prof. Carla Amado Gomes).
Penso que é esta a noção mais correcta a adoptar. Como já disse em comentário anterior, na minha opinião o ordenamento português adopta uma visão antropocêntrica do direito do ambiente, merecendo a natureza tutela jurídica na medida em que isso seja do interesse e necessário ao Homem. Em coerência com esta visão defendo também uma concepção ampla do objecto do direito do ambiente, não a vendo como indesejável por implicar um excessivo alargamento do objecto do Direito do Ambiente, mas antes como necessária e vantajosa por unificar uma variedade de objectos que têm relevância a nível de protecção ambiental, e assim permitir um tratamento mais sistemático e eficaz da matéria, não deixando no entanto, de poder ser dado algum tratamento específico aos vários ramos convergentes na medida em que este seja necessário e desejável.