Da protecção jurídica conferida pelo Estado Português conseguimos retirar que não há uma protecção adequada aos seres vivos que não o Homem. A verdade é que o artigo de Martha C. Nussbaum demonstra uma realidade que não é exclusiva de um país. Portugal inclui-se no rol de países em que, aceitando os circos e não fazendo um controlo apertado dos mesmos, se encontram situações degradantes. Importante é notar que não só nos circos haverão tais situações… nos próprios domicílios certamente também se verificam e tal é de repudiar.
De iure condicto, os animais, tal como são entendidos no nosso ordenamento jurídico, não são mais que coisas. Coisas móveis (artigo 202 nº1, 205 nº2 e 212 nº3 CC), susceptíveis mesmo de serem ocupadas (artigo 1318 CC). Como coisas que são, não têm direitos, sendo antes alvo de direitos. Não parece sustentável a existência de um direito dos animais, visto o conceito de direito, genericamente aceite, oriundo da organização societária e do Homem, é de que seria impossível atribuir a animais faculdades que não podem usufruir.
Contudo, o facto de os animais serem “vivos” não permite que se considerem como coisas “normais”, resultando daí que, apesar de não serem detentores de direitos subjectivos, a defesa dos animais deve antes ser entendida como um dever de conduta do Homem. Estar-se-á a tutelar interesses difusos reconhecidos a todos, advindo de um direito ao ambiente, na vertente de protecção da fauna, em virtude de uma comunidade geral e não de um interesse individual. Será assim uma obrigação que recai sobre o Homem de não maltratar os animais.
A imposição de tal dever de conduta ao Homem deve-se ao facto de este não ser meramente um titular de direitos subjectivos, são inerentes deveres, não só ao nível da protecção dos animais. Podemos afirmar que os direitos não são atribuídos directamente aos animais mas sim por via de um reconhecimento de um interesse geral, pertencente a toda uma comunidade.
Ao analisar-se a dimensão penal do direito dos animais, pela protecção contra os maus-tratos, o que se tem em vista tutelar são interesses comunitários com base em condutas tendencialmente censuráveis.
Defende o professor Fernando Araújo a atribuição de personalidade jurídica aos animais. Importa determinar se daí surgiria uma forma de tutelar os animais, protegendo-os da exploração e sofrimento a que estejam sujeitos nas várias manifestações sócio-culturais a que tendem a estar associados (touradas, circos, etc.).
Entendo não ser necessário atribuir personalidade jurídica para tutelar os animais. Ainda que os direitos sejam só aplicáveis aos homens, nada impede que seja reconhecida uma tutela especial aos “seres inferiores”.
Ao nível de protecção internacional, inicialmente surgiu com uma acentuada perspectiva económica e de utilidade para o homem. Veja-se por exemplo a convenção de Paris de 1902 que incidia sobre a protecção de aves com impacto positivo na agricultura. Não se visava uma perspectiva ecológica, mas sim benefícios económicos futuros.
O Decreto 13/93 veio a aprovar a Convenção Europeia para a Protecção dos Animais de Companhia. Daí retira-se o princípio de que não deve ser causado sofrimento a animais, concretizando o artigo 11 que, caso seja necessário causa-lo, se deve tentar minimizar a dor.
O professor Bacelar Gouveia refere, no que concerne ao conceito de animal na lei 92/95, que não é “todo e qualquer animal – enquanto ser vivo que se contrapõe ao Homem e ao reino vegetal – que se apresenta relevante para a aplicação desta lei. Cura-se unicamente com a protecção dos animais que sejam susceptíveis de sofrimento”. Não nos parece que este critério seja admissível. A protecção dos animais não pode ser discriminatória, ou se defende todos os animais enquanto tais, ou não se defende qualquer tipo de animal. Este é o tipo de discriminação que levou a situações históricas embaraçosas para a Humanidade, ainda que de forma análoga, não nos parece sensato discriminar deste modo.
Mas se o estado actual da legislação ainda vai conferindo alguma protecção aos animais, não podemos dizer que a jurisprudência nacional seja tão favorável. Veja-se a este respeito o Acórdão do STJ de 19 de Outubro de 2004 (processo 3354/04) sobre o tiro aos pombos que considerou a actividade licita por entender que a morte dos pombos não traduzia um acto gratuito de força ou brutalidade, mas sim uma modalidade desportiva com tradição e relevância em Portugal. Esta decisão é muito controversa… Será legitimo invocar tradições para viabilizar o sofrimento de determinados animais?
A posição do professor Menezes Cordeiro parece-nos sensata: “se a morte de um animal, sem sofrimento dispensável, parece adequada para fins alimentares, o seu sofrimento inútil merece reprovação da sociedade e da cultura”. Na senda deste autor, repudiamos certos tipos de tradições que visem sobretudo sofrimento inútil prevalecendo um interesse lúdico.
De Iure Condendo, considero que a legislação nacional devia ir noutro sentido e criar eventualmente um regime mais adequado. Sendo impossível defender a titularidade de direitos e deveres pelos animais, só uma tutela indirecta parece sustentável. Impor deveres ao homem e estabelecer linhas de conduta, assentes em princípios gerais sociais e no bom senso, poderá ser uma via adequada à protecção. A imposição de um dever de “non facere” que se dirija a toda a sociedade poderia levar a uma tutela não ofensiva da integridade dos animais.
Impõe-se a protecção dos animais por fazerem parte da natureza, devendo esta ser respeitada porque o Homem tem um direito fundamental ao ambiente, no seguimento da posição defendida do Vasco Pereira da Silva.
Note-se que a própria constituição não faz qualquer referência, directa, à protecção dos animais. Limita-se a fazer uma protecção abrangente ao ambiente e natureza. Nesta matéria parece-nos ser necessária uma revisão constitucional que colmate uma lacuna aparente, de modo a viabilizar uma melhor tutela dos seres não humanos.
Ainda que os direitos sejam aplicáveis ao Homem, não implica que se deva equiparar os direitos dos humanos aos dos animais, mas parece necessário proceder a algumas alterações legislativas para uma tutela mais consistente e criação de legislação específica de protecção. É inerente à própria dignidade humana evitar sofrimento gratuito sobre animais, sobretudo os desprovidos de defesa.
Tendo o Homem direito ao ambiente, é meu entendimento que daí deve derivar um direito a conviver com todos os seres vivos, de preferência de forma saudável, desenvolvendo legislação nesse sentido.
De iure condicto, os animais, tal como são entendidos no nosso ordenamento jurídico, não são mais que coisas. Coisas móveis (artigo 202 nº1, 205 nº2 e 212 nº3 CC), susceptíveis mesmo de serem ocupadas (artigo 1318 CC). Como coisas que são, não têm direitos, sendo antes alvo de direitos. Não parece sustentável a existência de um direito dos animais, visto o conceito de direito, genericamente aceite, oriundo da organização societária e do Homem, é de que seria impossível atribuir a animais faculdades que não podem usufruir.
Contudo, o facto de os animais serem “vivos” não permite que se considerem como coisas “normais”, resultando daí que, apesar de não serem detentores de direitos subjectivos, a defesa dos animais deve antes ser entendida como um dever de conduta do Homem. Estar-se-á a tutelar interesses difusos reconhecidos a todos, advindo de um direito ao ambiente, na vertente de protecção da fauna, em virtude de uma comunidade geral e não de um interesse individual. Será assim uma obrigação que recai sobre o Homem de não maltratar os animais.
A imposição de tal dever de conduta ao Homem deve-se ao facto de este não ser meramente um titular de direitos subjectivos, são inerentes deveres, não só ao nível da protecção dos animais. Podemos afirmar que os direitos não são atribuídos directamente aos animais mas sim por via de um reconhecimento de um interesse geral, pertencente a toda uma comunidade.
Ao analisar-se a dimensão penal do direito dos animais, pela protecção contra os maus-tratos, o que se tem em vista tutelar são interesses comunitários com base em condutas tendencialmente censuráveis.
Defende o professor Fernando Araújo a atribuição de personalidade jurídica aos animais. Importa determinar se daí surgiria uma forma de tutelar os animais, protegendo-os da exploração e sofrimento a que estejam sujeitos nas várias manifestações sócio-culturais a que tendem a estar associados (touradas, circos, etc.).
Entendo não ser necessário atribuir personalidade jurídica para tutelar os animais. Ainda que os direitos sejam só aplicáveis aos homens, nada impede que seja reconhecida uma tutela especial aos “seres inferiores”.
Ao nível de protecção internacional, inicialmente surgiu com uma acentuada perspectiva económica e de utilidade para o homem. Veja-se por exemplo a convenção de Paris de 1902 que incidia sobre a protecção de aves com impacto positivo na agricultura. Não se visava uma perspectiva ecológica, mas sim benefícios económicos futuros.
O Decreto 13/93 veio a aprovar a Convenção Europeia para a Protecção dos Animais de Companhia. Daí retira-se o princípio de que não deve ser causado sofrimento a animais, concretizando o artigo 11 que, caso seja necessário causa-lo, se deve tentar minimizar a dor.
O professor Bacelar Gouveia refere, no que concerne ao conceito de animal na lei 92/95, que não é “todo e qualquer animal – enquanto ser vivo que se contrapõe ao Homem e ao reino vegetal – que se apresenta relevante para a aplicação desta lei. Cura-se unicamente com a protecção dos animais que sejam susceptíveis de sofrimento”. Não nos parece que este critério seja admissível. A protecção dos animais não pode ser discriminatória, ou se defende todos os animais enquanto tais, ou não se defende qualquer tipo de animal. Este é o tipo de discriminação que levou a situações históricas embaraçosas para a Humanidade, ainda que de forma análoga, não nos parece sensato discriminar deste modo.
Mas se o estado actual da legislação ainda vai conferindo alguma protecção aos animais, não podemos dizer que a jurisprudência nacional seja tão favorável. Veja-se a este respeito o Acórdão do STJ de 19 de Outubro de 2004 (processo 3354/04) sobre o tiro aos pombos que considerou a actividade licita por entender que a morte dos pombos não traduzia um acto gratuito de força ou brutalidade, mas sim uma modalidade desportiva com tradição e relevância em Portugal. Esta decisão é muito controversa… Será legitimo invocar tradições para viabilizar o sofrimento de determinados animais?
A posição do professor Menezes Cordeiro parece-nos sensata: “se a morte de um animal, sem sofrimento dispensável, parece adequada para fins alimentares, o seu sofrimento inútil merece reprovação da sociedade e da cultura”. Na senda deste autor, repudiamos certos tipos de tradições que visem sobretudo sofrimento inútil prevalecendo um interesse lúdico.
De Iure Condendo, considero que a legislação nacional devia ir noutro sentido e criar eventualmente um regime mais adequado. Sendo impossível defender a titularidade de direitos e deveres pelos animais, só uma tutela indirecta parece sustentável. Impor deveres ao homem e estabelecer linhas de conduta, assentes em princípios gerais sociais e no bom senso, poderá ser uma via adequada à protecção. A imposição de um dever de “non facere” que se dirija a toda a sociedade poderia levar a uma tutela não ofensiva da integridade dos animais.
Impõe-se a protecção dos animais por fazerem parte da natureza, devendo esta ser respeitada porque o Homem tem um direito fundamental ao ambiente, no seguimento da posição defendida do Vasco Pereira da Silva.
Note-se que a própria constituição não faz qualquer referência, directa, à protecção dos animais. Limita-se a fazer uma protecção abrangente ao ambiente e natureza. Nesta matéria parece-nos ser necessária uma revisão constitucional que colmate uma lacuna aparente, de modo a viabilizar uma melhor tutela dos seres não humanos.
Ainda que os direitos sejam aplicáveis ao Homem, não implica que se deva equiparar os direitos dos humanos aos dos animais, mas parece necessário proceder a algumas alterações legislativas para uma tutela mais consistente e criação de legislação específica de protecção. É inerente à própria dignidade humana evitar sofrimento gratuito sobre animais, sobretudo os desprovidos de defesa.
Tendo o Homem direito ao ambiente, é meu entendimento que daí deve derivar um direito a conviver com todos os seres vivos, de preferência de forma saudável, desenvolvendo legislação nesse sentido.