domingo, 10 de maio de 2009

Até onde vão,afinal,os nossos direitos sobre os direitos dos animais?(Comentário à frase da Prof. Marta Nussbaum,da Faculdade de Direito de Chicago)

Para muitas pessoas, é claro o conceito de existência digna de um animal; no entanto, são capazes de o aplicar em relação ao gato que foi maltratado ou ao cão abandonado mas não em relação a um cavalo de um circo ou de touradas.
A resposta para este problema não passa, em minha opinião, pela atribuição de personalidade jurídica aos animais mas sim por uma legislação mais exigente que, de certo modo, ajude a reeducar algumas mentes e a consciencializar outras, desde cedo, do que é realmente conceder o direito a uma existência digna a um animal. Afinal, a lei também pode anteceder a realidade social e levá-la à mudança, à evolução.
Também estou longe de concordar com o tratamento dos animais como "coisas" pelo Direito, mesmo que sejam considerados "coisas especiais ou sensíveis". O termo incomoda-me porque sabemos que os animais são algo mais e, por outro lado, há contradições técnicas nesta concepção, como vem Helena Telino Neves afirmar na sua tese A Natureza Jurídica dos Animais , como por exemplo, a difícil conciliação do direito de propriedade no que toca aos animais selvagens.
Ainda assim, como a mesma autora refere, também não sou a favor da atribuição de personalidade jurídica aos animais...Como atribuir-lhes obrigações?
Parece-me que não será difícil atribuir-lhes direitos, mesmo sem essa personificação. Acredito que, com a tutela legal adequada, protegeríamos os interesses destes seres vivos sem exageros.
Também um certo equilíbrio é exigido no que toca à definição de quais os direitos dos animais: em minha opinião, nem touradas, nem circos, nem caça se podem justificar apenas por serem tradição cultural ou prática desportiva socialmente aceite mas também não sou a favor de uma sociedade cem por cento vegetariana. Há que ter em conta valores imperiosos como a utilidade para o homem (mas utilidade aferida em termos de necessidade de alimentação, por exemplo) ou o equilíbrio ambiental; não podemos esquecer, no mínimo, a obrigação moral de o Homem respeitar todas as criaturas vivas.
De que interessa atribuir às associações de protecção dos animais legitimidade para proteger e interceder por eles ( Lei 92/95, de 12 de Setembro), se os tribunais vêm depois considerar que actividades com "tradição" e "relevância cultural" em Portugal se podem impôr aos valores acima mencionados?
Se, desde 1928, se proíbe o uso de aguilhão ou outro instrumento perfurante na condução de animais em Portugal ,porque se admite o uso de bandeirilhas nas touradas, no mesmo país, em 2009?
Há uma clara evolução no regime da protecção dos animais no nosso país, nomeadamente com a ratificação da Convenção Europeia para a Protecção dos Animais de Companhia, em 1993 mas a tutelas destes seres vivos , em muitos aspectos, iguais a nós não é ainda suficiente.
Por exemplo, nos Estados Unidos da América decorre agora, segundo notícia de Abril da Associated Press, um debate no Supremo Tribunal em que se discute se a liberdade de expressão é um valor suficientemente importante para permitir que se divulguem filmes contendo imagens de lutas de cães e mortes violentas de pequenos animais.
Um debate semelhante existe há muito em Portugal, tendo como preocupação principal os animais usados nas touradas e nos circos mas os Tribunais, principalmente os superiores, e a sociedade não parecem ainda preparados para tomar posição no sentido de tentar , pelo menos, diminuir os casos de maus tratos inúteis a animais.
Debate-se por estes dias na Assembleia da República a utilização de animais nos circos. É verdade que as condições em que os animais são mantidos ,na maior parte das vezes, não são realmente um sinal de concessão de uma existência digna mas não é raro ver os circos cheios e com filas intermináveis por altura do Natal.
É preciso informar a sociedade, dar-lhe alternativas, educá-la através de uma lei mais severa, mais ponderada e mais específica mas também será preciso reintegrar todas as pessoas que, de algum modo, têm as suas vidas profissionais ligadas a esta utilização errada dos animais e que dela tiram algum proveito económico. Terão de aprender a usar os animais de outro modo , com uma finalidade realmente importante para o homem e a dar-lhes as melhores condições possíveis.
Podemos começar agora a construir uma nova tradição cultural no nosso país...