sábado, 2 de maio de 2009

Antropocentrismo vs Ecocentrismo

Na base da elevação do ambiente a bem jurídico digno de protecção jurídica está o activismo estadual, que leva à assunção pelo Estado de tarefas novas integradas no objectivo de protecção ambiental, e o crescente interesse dos cidadãos em obviar as consequências advindas do desenvolvimento económico e em implementar melhores condições de vida, numa perspectiva de solidariedade comunitária.
A Constituição da República Portuguesa tem grandes preocupações ambientais, dedicando duas disposições fundamentais ao ambiente. São eles o artigo 9º (tarefas estaduais) e o artigo 66º (direito fundamental). Todavia, antes de glosar sobre o modo como a constituição trata o ambiente, será melhor, ou pelo menos mais didáctico, analisar as correntes que se defrontam neste tema, o ecocentrismo e o antropocentrismo.
A tese que defende o ecocentrismo sustenta que o ambiente deve ser tutelado por si mesmo, enquanto bem jurídico merecedor de protecção, independentemente das necessidades do homem, considerando-o como bem jurídico fundamental máximo e autónomo (Freitas do Amaral e Carla Amado Gomes, por exemplo). Os defensores do antropocentrismo, por sua vez, afirmam que a defesa do ambiente é instrumental às necessidades do Homem, considerando ser esta a via mais eficaz para proteger a natureza. Vasco Pereira da Silva não considera adequadas “ (…) nem as soluções que ignoram a tutela dos direitos e dos bens ambientais, nem aqueloutras que (…) conduzem à personificação das realidades da Natureza, falando em direitos subjectivos das flores, da água, do mar, da floresta, dos animais…” O autor envereda pela protecção do ambiente mas numa perspectiva antropocêntrica ecológica: “as normas reguladoras do ambiente destinam-se também à protecção dos interesses dos particulares, que desta forma são titulares de direitos subjectivos públicos”.
Voltando agora à Lei Fundamental, o artigo 66º, depois de consagrar o direito de todos ao ambiente e o correlativo dever de o defender no nº1, enumera as tarefas do Estado direccionadas para a protecção ambiental no nº2. Gomes Canotilho diz que a “leitura conjugada das normas constitucionais e das normas legais aponta, desde logo, para a existência de um direito subjectivo ao ambiente, autónomo e distinto de outros direitos também constitucionalmente protegidos”, aparecendo o direito ao ambiente sadio e ecologicamente equilibrado como um direito pertencente a qualquer pessoa, relegando-se o equilíbrio ecológico para segundo plano.
Apesar de o artigo 9º visar a subsistência do Homem através de uma tutela objectiva do ambiente, creio que a Constituição da República Portuguesa, no geral, consagra o antropocentrismo, com uma tutela subjectiva do direito do ambiente. Todavia, não se está perante um antropocentrismo radical (proteger o ambiente com finalidades estritas de vantagens económicas), mas sim moderado. Vasco Pereira da Silva entende que o Homem é a pedra angular do direito ao ambiente, não olvidando, contudo, as preocupações ambientais que as sociedades contemporâneas têm vindo a experimentar graças, sobretudo, ao rápido desenvolvimento tecnológico. O Direito do Ambiente deve, portanto, ser regulamentado de modo a preservar-se e proteger-se a realidade ecológica em função do Homem.
A conclusão a retirar é a de que, se a tutela subjectiva de protecção ambiental é a predominante, a tutela objectiva não pode nem deve ser desconsiderada, pois ambas são relevantes, estabelecendo-se entre elas uma relação de complementaridade.
A meu ver, o fim comum a ambas as teses é a protecção ambiental, seja de uma perspectiva em que se protege o ambiente enquanto tal ou em que se protege o ambiente enquanto necessidade humana.
O ambiente agradece!