O presente post visa, no essencial, proceder a uma análise sumária do acórdão do STA sobre a localização da ponte Vasco da Gama, tendo na sua base uma visão crítica do douto acórdão.
A Liga para Protecção da Natureza recorre contenciosamente da deliberação do Conselho de Ministros, que aprovou o Decreto-Lei n.º 220/92, de 15 de Outubro, que no seu art. 1.º estabelece que é aprovada a localização da nova ponte sobre o Tejo, situada entre as proximidades do Samouco, no município de Alcochete, e Sacavém, no município de Loures.
Os fundamentos do recurso são os seguintes: (i) por consequência da transposição da Directiva 79/409/CEE, que tem como objecto a conservação e protecção das aves selvagens que habitam o território da Comunidade Económica Europeia, foram criadas Zonas de Protecção Especial (ZPE), sendo uma delas a Zona do Estuário do Tejo, que é considerada uma das mais importantes áreas húmidas da Europa do ponto de vista da conservação das aves aquáticas selvagens; (ii) das largas de dezenas de espécies selvagens que ocorrem na ZPE do Estuário do Tejo, um número assinalável consta do anexo I da Directiva e como tal são objecto de protecção especial; (iii) o governo português aquando a classificação das ZPE não definiu o regime legal aplicável, no entanto, considera a recorrente que se aplica o art. 4.º da Directiva dada a teoria do efeito directo; (iv) a ser construída a nova ponte sobre o Tejo, resulta, inevitavelmente, a deterioração significativa dos habitats existentes e a decorrente perturbação das aves protegidas, não respeitando, assim, o teor do art. 4.º/4 da Directiva; (v) alega ainda a recorrente que o acto impugnado foi praticado com vício de forma por preterição de formalidades do procedimento administrativo relativo à avaliação dos efeitos determinados no ambiente pela escolha do local de construção da ponte sobre o Tejo, não foi respeitado o teor dos arts. 3.º, 4.º e 5.º do Decreto-Lei nº 186/90, de 6 de Junho e os arts. 2.º e 3.º do Decreto Regulamentar n.º 38/90.
No douto acórdão decidiu-se que o art. 4.º/4 da Directiva não foi desrespeitado na medida em que não é uma disposição incondicional e suficientemente precisa, logo não tem efeito directo e que a decisão governamental não tinha de ser sujeita ao processo prévio de Avaliação de Impacto Ambiental (AIA) porque na deliberação impugnada "apenas se dicidiu que a localização se situava entre as proximidades do Samouco, no município de Alcochete, e Sacavém, no município de Loures", não tendo sido "aprovada a realização de obras de construção ou qualquer instalação de obras", sendo apenas esta submetida ao procedimento administrativo AIA. Reforça ainda este ponto de vista afirmando que "não é a fase da aprovação da localização das obras que está submetida ao procedimento administrativo de AIA previsto no Decreto-Lei n.º 186/90 e Decreto Regulamentar n.º 38/90 e tão só a fase elaboração do projecto e da concepção da construção da obra".
No entendimento de José Eduardo Figueiredo Dias, esta decisão assenta em pressupostos errados e ignora os verdadeiros objectivos que estão por detrás da legislação relativa à AIA. Com o intuito de rebater o entendimento seguido no referido acórdão, invoca os seguintes argumentos: (i) a decisão de localização da ponte sobre o Tejo está inserida no âmbito do Decreto-Lei n.º 186/90 quando este alude a "outras intervenções no meio natural ou na paisagem" (art. 1.º/2 al. a)) ou a "projectos que, pela sua (...) localização, se considerem susceptíveis de provocar incidências significativas no ambiente" (art. 2.º/2). Como tal, era necessário proceder à sua AIA; (ii) por razões lógicas: o argumento de que só o projecto de construção e não a decisão de localização está sujeito à AIA é contraditório, uma vez que quando se aprova a localização está-se a aprovar a futura construção da ponte num local perfeitamente definido; (iii) não deverá ser a altura de realização de um concurso público internacional para a concessão da obra o momento próprio para se proceder à AIA, pois, se, eventualmente, a avaliação for no sentido da insustentabilidade do projecto acarreterá avultados custos desnecessários; (iv) a AIA é um instrumento de realização dos princípios do desenvolvimento sustentável e do aproveitamento racional dos recursos disponíveis e tem como fundamento último o princípio preventivo, de acordo com o qual as actuações no amiente devem ser consideradas de "forma antecipativa", estando em causa evitar a produção de danos e não tanto "remediar mal feitos", daí a necessidade de proceder à AIA antes da decisão de localização; (v) a importância revestida pela AIA, ocupando um lugar de destaque no contexto da legislação ambiental e o papel que a protecção e a promoçao do ambiente tem de revestir nas preocupações e prioridades estaduais. A nossa Constituição é paradigmática a este propósito, definindo no art. 9.º al. e) a "defesa da natureza e do ambiente e a preservação dos recursos naturais" como uma das "tarefas fundamentais do Estado" e nos termos do art. 66º/2 al. a), estabelece como incumbência do Estado a de "pevenir e controlar a poluição e os seus efeitos"; (vi) em termos jurídico-ambientais, todas as razões apontam para configurar a decisão de localização da ponte como a decisão fundamental em termos de tutela ambiental. Como tal, impunha-se no caso sub iudice, a AIA antes de ser determinada tal localização.
Por tudo isto, existe neste acórdão uma orientação com a qual não concordo. Seguindo a argumentação de José Eduardo Figueiredo Dias, considero que a decisão do acórdão do STA sobre a localização da ponte Vasco da Gama foi "pouco feliz".
A Liga para Protecção da Natureza recorre contenciosamente da deliberação do Conselho de Ministros, que aprovou o Decreto-Lei n.º 220/92, de 15 de Outubro, que no seu art. 1.º estabelece que é aprovada a localização da nova ponte sobre o Tejo, situada entre as proximidades do Samouco, no município de Alcochete, e Sacavém, no município de Loures.
Os fundamentos do recurso são os seguintes: (i) por consequência da transposição da Directiva 79/409/CEE, que tem como objecto a conservação e protecção das aves selvagens que habitam o território da Comunidade Económica Europeia, foram criadas Zonas de Protecção Especial (ZPE), sendo uma delas a Zona do Estuário do Tejo, que é considerada uma das mais importantes áreas húmidas da Europa do ponto de vista da conservação das aves aquáticas selvagens; (ii) das largas de dezenas de espécies selvagens que ocorrem na ZPE do Estuário do Tejo, um número assinalável consta do anexo I da Directiva e como tal são objecto de protecção especial; (iii) o governo português aquando a classificação das ZPE não definiu o regime legal aplicável, no entanto, considera a recorrente que se aplica o art. 4.º da Directiva dada a teoria do efeito directo; (iv) a ser construída a nova ponte sobre o Tejo, resulta, inevitavelmente, a deterioração significativa dos habitats existentes e a decorrente perturbação das aves protegidas, não respeitando, assim, o teor do art. 4.º/4 da Directiva; (v) alega ainda a recorrente que o acto impugnado foi praticado com vício de forma por preterição de formalidades do procedimento administrativo relativo à avaliação dos efeitos determinados no ambiente pela escolha do local de construção da ponte sobre o Tejo, não foi respeitado o teor dos arts. 3.º, 4.º e 5.º do Decreto-Lei nº 186/90, de 6 de Junho e os arts. 2.º e 3.º do Decreto Regulamentar n.º 38/90.
No douto acórdão decidiu-se que o art. 4.º/4 da Directiva não foi desrespeitado na medida em que não é uma disposição incondicional e suficientemente precisa, logo não tem efeito directo e que a decisão governamental não tinha de ser sujeita ao processo prévio de Avaliação de Impacto Ambiental (AIA) porque na deliberação impugnada "apenas se dicidiu que a localização se situava entre as proximidades do Samouco, no município de Alcochete, e Sacavém, no município de Loures", não tendo sido "aprovada a realização de obras de construção ou qualquer instalação de obras", sendo apenas esta submetida ao procedimento administrativo AIA. Reforça ainda este ponto de vista afirmando que "não é a fase da aprovação da localização das obras que está submetida ao procedimento administrativo de AIA previsto no Decreto-Lei n.º 186/90 e Decreto Regulamentar n.º 38/90 e tão só a fase elaboração do projecto e da concepção da construção da obra".
No entendimento de José Eduardo Figueiredo Dias, esta decisão assenta em pressupostos errados e ignora os verdadeiros objectivos que estão por detrás da legislação relativa à AIA. Com o intuito de rebater o entendimento seguido no referido acórdão, invoca os seguintes argumentos: (i) a decisão de localização da ponte sobre o Tejo está inserida no âmbito do Decreto-Lei n.º 186/90 quando este alude a "outras intervenções no meio natural ou na paisagem" (art. 1.º/2 al. a)) ou a "projectos que, pela sua (...) localização, se considerem susceptíveis de provocar incidências significativas no ambiente" (art. 2.º/2). Como tal, era necessário proceder à sua AIA; (ii) por razões lógicas: o argumento de que só o projecto de construção e não a decisão de localização está sujeito à AIA é contraditório, uma vez que quando se aprova a localização está-se a aprovar a futura construção da ponte num local perfeitamente definido; (iii) não deverá ser a altura de realização de um concurso público internacional para a concessão da obra o momento próprio para se proceder à AIA, pois, se, eventualmente, a avaliação for no sentido da insustentabilidade do projecto acarreterá avultados custos desnecessários; (iv) a AIA é um instrumento de realização dos princípios do desenvolvimento sustentável e do aproveitamento racional dos recursos disponíveis e tem como fundamento último o princípio preventivo, de acordo com o qual as actuações no amiente devem ser consideradas de "forma antecipativa", estando em causa evitar a produção de danos e não tanto "remediar mal feitos", daí a necessidade de proceder à AIA antes da decisão de localização; (v) a importância revestida pela AIA, ocupando um lugar de destaque no contexto da legislação ambiental e o papel que a protecção e a promoçao do ambiente tem de revestir nas preocupações e prioridades estaduais. A nossa Constituição é paradigmática a este propósito, definindo no art. 9.º al. e) a "defesa da natureza e do ambiente e a preservação dos recursos naturais" como uma das "tarefas fundamentais do Estado" e nos termos do art. 66º/2 al. a), estabelece como incumbência do Estado a de "pevenir e controlar a poluição e os seus efeitos"; (vi) em termos jurídico-ambientais, todas as razões apontam para configurar a decisão de localização da ponte como a decisão fundamental em termos de tutela ambiental. Como tal, impunha-se no caso sub iudice, a AIA antes de ser determinada tal localização.
Por tudo isto, existe neste acórdão uma orientação com a qual não concordo. Seguindo a argumentação de José Eduardo Figueiredo Dias, considero que a decisão do acórdão do STA sobre a localização da ponte Vasco da Gama foi "pouco feliz".