quinta-feira, 14 de maio de 2009

5ª Tarefa: "Nem 8 nem 80...ali pelo meio"

Primeiro que tudo distingamos. Antropocentrismo é aquela corrente, aquele movimento que defende que o Homem está no centro de tudo, “o Homem é a medida de todas as coisas”, tudo é feito em sua função, para o seu bem-estar. O desenvolvimento, a protecção e a preservação da Natureza é condição essencial para o desenvolvimento da Pessoa Humana (nesta perspectiva, dir-se-ia que a Constituição é verde por nossa causa, isto é, consagra o Direito ao Ambiente e pressupõe prestações do Estado nesse sentido, para servir fins humanos). Ecocentrismo, pelo contrário, coloca a Natureza no topo da pirâmide; o Meio Ambiente estaria no centro da tomada de todas as decisões, tudo o que o Homem faz é em benefício do Ambiente (nesta perspectiva, os direitos e deveres constitucionais ambientais destinam-se a proteger a própria Natureza). Olhando para a CRP, somos forçados a admitir que foi adoptada uma concepção que tem um pouco destas 2 teorias. Para o antropocentrismo a CRP deixa-nos a pista do mecanismo dos direitos fundamentais (mais concretamente o art. 66.º), com o seu respectivo regime (arts. 17.º e 18.º principalmente) e os meios de defesa que são disponibilizados (tutela contenciosa ambiental) aos sujeitos lesados. Outra pista: a CRP apela à dignidade da Pessoa Humana logo no art. 1.º. O princípio do desenvolvimento sustentável parece ser, também, um bom argumento a favor do antropocentrismo, já que o objectivo é o respeito pelas gerações futuras e o seu direito a uma qualidade de vida condigna. Já para o ecocentrismo a CRP deixa-nos à disposição o art. 9.º, d) e e) - deveres para o Estado e para cada um de nós – e temos também o instituto da responsabilidade civil por danos ecológicos. Concordo perfeitamente com a posição adoptada pelo nosso legislador constituinte, que preferiu conciliar as duas perspectivas (nem 8 nem 80): nem se atribui demasiada tutela subjectivista em detrimento do Meio Ambiente (pois todos temos o dever de contribuir para “um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado”), nem se coloca o ecofundamentalismo no centro em detrimento do Homem (o art. 66.º nº 1 começa, desde logo, por afirmar que “todos têm direito”). Também não faz sentido atribuir personalidade jurídica às aves ou às árvores que não têm meios de se “fazer ouvir” em Tribunal. Quando se tentou discutir a autonomia ou não dos princípios da prevenção e da precaução, já aí o Doutor Vasco Pereira da Silva afirmava a bom tom que criar um princípio autónomo da precaução era cair num ecofundamentalismo excessivo. Claro está, que o Homem não pode exigir uma boa qualidade de vida se não contribuir para tal; se se adoptar um comportamento ecológico, depois retiram-se benefícios. A regência da cadeira de Ambiente adopta um “antropocentrismo atenuado” (ao contrário da Doutora Carla Amado Gomes que é defensora de um ecocentrismo algo moderado), e é esta a expressão que mais se adequa ao art. 66.º . Quanto às consequências podemos sumariamente identificar o seguinte: estabeleceu-se uma espécie de ciclo vicioso (há direitos porque há deveres, para se ter direito ao ambiente há que cumprir determinados deveres, é como que aquela regra do Tu Quoque! em Direito Civil, quem dá origem a um dano não pode depois vir exigir indemnização e sair a ganhar); quando se violam esses deveres há lugar a responsabilidade por danos ecológicos; há diversa legislação extravagante sobre Ambiente (Lei de Bases do Ambiente, Lei da Água, Lei de Acesso à Informação, Projectos PIN, entre outras); princípio da proporcionalidade em sentido amplo (art. 18.º CRP) quando há colisão de direitos fundamentais, em que um deles seja o direito ao ambiente; o art. 66.º torna-se, assim, uma espécie de instrução dada ao Estado e aos sujeitos (“incumbe ao Estado (…) com o envolvimento e participação dos cidadãos”) de como devem agir.
Conclui-se que esta solução tomada pelo legislador constitucional não podia ser melhor – afigura-se extremamente adequada e equilibrada.