A Constituição da República Portuguesa («CRP») consagra um conjunto de princípios fundamentais em matéria de Direito do ambiente que embora se encontrem ainda numa fase embrionária, ou melhor, de maturação jurídica – na medida em que resultam de um «processo forçosamente lento de consciencialização social e integração efectiva no ordenamento juridico de novas ideias» (Tomas Ramos Fernandez) –, não deixam de se assumir enquanto padrões de conduta. Os referidos princípios fundamentais traduzem-se no princípio do aproveitamento racional dos recursos naturais, no princípio do poluidor pagador e no princípio do desenvolvimento sustentável, que me cabe analisar. Antes, porém, de passar à questão do seu cariz principológico, cumpre concretizar o seu conteúdo.
A nossa Lei Fundamental, no seu artigo 66.º n.º 2, prevê expressamente a necessidade de se alcançar um estádio de desenvolvimento sustentável enquanto condição de realização do direito do ambiente. Deste modo, cabe começar por densificar o conceito de «desenvolvimento sustentável». Ora, se inicialmente o seu âmbito essencial se resumia a um cariz puramente económico (conciliação da preservação do meio ambiente com o desenvolvimento socio-económico) hoje, segundo o que ficou estabelecido na Comissão de Brudtland, «desenvolvimento sustentável» define-se como «aquele que satisfaz as necessidades do presente sem comprometer a capacidade das futuras gerações satisfazerem as suas próprias necessidades». Este princípio obriga-nos a despir de toda e qualquer concepção antropocêntrista em nome das gerações vindouras. O paradigma não será mais «viver melhor amanhã», mas sim «viver hoje de modo diferente, aqui e agora». Todos somos co-responsáveis por deixar o planeta em condições saudáveis e, como tal, sobre todos impende o dever de garantir a consciência e responsabilidade nos consumos, a incorporar nos respectivos quotidianos preocupações tão sérias como, a título de exemplo, o da destruição da camada do ozono e o consequente efeito de estufa.
Todos somos provocados a agir enquanto cidadãos activos na vida pública, na mudança de mentalidades e costumes, na participação da formulação de políticas públicas de respeito e perservação do meio ambiente. Torna-se urgente educar para as questões ecológicas, de modo a formar cidadãos capazes de, se não mudar, pelo menos, garantir a sobrevivência do mundo.
O princípio em análise visa tão só equalizar, conciliar e encontrar um ponto de equilíbrio entre actividade económica e o uso adequado, racional e responsável dos recursos naturais, respeitando-os e preservando-os para as gerações actuais e, mormente, para as gerações subsequentes.
Pautando-se a actividade económica pela conjugação do binómio «maximização dos lucros» e «minimização dos custos», desde logo nos damos conta do forte, e muitas vezes danoso, impacto no ambiente que acaba por colocar em perigo o próprio equilíbrio ecológico e a sobrevivência das espécies no planeta, inclusivamente a humana!
Numa tentativa de evitar a catástrofe, o Princípio do desenvolvimento sustentável vem vedar ao empresário «qualquer actuação aleatória e indiferente em relação aos bens ambientais», obrigando, nas palavras do Professo Vasco Pereira da Silva, à «fundamentação ecológica» das decisões jurídicas tendentes ao desenvolvimento económico. Consequentemente, por este princípio ser digno de consagração constitucional, qualquer tomada de decisões insuportavelmente gravosas para o ambiente será tida como inconstitucional.
Após um breve enquadramento do princípio em análise, cabe perguntar se se trata verdadeiramente de um princípio na plenitude da sua acepção.
Do Professor Gomes Canotilho retiramos a definição de princípio constitucional como sendo um padrão de conduta dotado de um elevado grau de abstracção, logicamente carente de mediação do legislador para aplicação no caso concreto e pelo seu cariz de pilar das restantes regras jurídicas por se identificar com os valores da consciência colectiva .Percebe-se, desta feita, a relevÂncia ímpar dos dos princípios para o Direito. São eles autênticos vectores , linhas directivas, regras mestres que orientam o intérprete na sua causa hermenêutica, ceifando eventuais antagonismos entre as normas jurídicas.
Muito embora concorde (apenas) em parte com a afirmação da Professora Carla Amado Gomes, no sentido deste princípio ser dotado de uma concretização redutora pela sua sucessiva aplicação casuística, , tal característica, no meu entendimento, não é suficiente para retirar a sua natureza principológica, ou, nas palavras da Professora, considerá-lo como um falso princípio fruto da «imaginação ecológica» de duvidosa autonomia face ao princípio da proporcionalidade.
Atente-se que o legislador nacional consagrou o desenvolvimento sustentável não apenas enquanto mero princípio, mas enquanto princípio com dignidade constitucional! Será ainda de referir, que para além do seu carácter constitucional, encontra ainda suporte legitimador nos compromissos internacionais assumidos pelo Estado Português. Entre todos os princípios de Direito do Ambiente este ocupa posição de predominância, mormente porque irá, numa escala axiológica, influenciar, complementar e orientar os demais, viabilizando um tratamento correcto, seguro e adequeado à temática ambiental.
Embora o desenvolvimento sustentável seja sem dúvida um dos maiores desafios da nossa sociedade actual, temos vindo a assistir a um importante progresso nesse sentido, tornando-se assunto obrigatório em cima de toda e qualquer mesa de discussão. Podemos actualmente verificar inúmeros reflexos deste tão importante princípio, como por exemplo a imposição de estudo de impacto ambiental aquando da «instalação de obras ou actividades potencialmente perigosas » cujo objectivo é reduzir ao máximo possível o dano da prática económica sobre a Natureza. E ainda mais perto, temos a recente iniciativa da nossa faculdade em promover a reciclagem através da colocação de depósitos para o efeito.
A ideia de sustentabilidade reclama uma mudança de atitude no sentido de passarmos a associar o futuro às decisões do dia-a-dia. Para tal, devemos ser autores de uma política de governo coerente capaz de travar o crescimento económico a todo o custo de modo a a buscar-se a preservação do património ambiental, que como bem sabemos se trata de um bem transnacional, de todos os seres vivos e das gerações vindouras. Nos dias de hoje, mais que nunca, impõe-se a consagração de máxima de solidariedade ambiental.