quarta-feira, 29 de abril de 2009

1ª Tarefa:Será que faz sentido autonomizar o princípio da precaução?

O Direito do Ambiente, como ramo de direito transversal, é composto por duas dimensões essenciais e complementares, nomeadamente: a dimensão subjectiva, que se traduz no direito do ambiente como um dos direitos fundamentais dos cidadãos (artigo 66º da Constituição da República Portuguesa, de agora em diante, CRP) e a dimensão objectiva, que se refere à preservação do meio ambiente como tarefa fundamental do Estado (artigo 9º alínea d) e e)) CRP, devido ao próprio ambiente ser entendido como um bem jurídico fundamental.
Consequentemente, com a consagração, na Constituição Portuguesa (em 1989), da feição objectiva do Direito do Ambiente destacam-se quatro princípios fundamentais que, por sua vez, também são considerados grandes princípios na ordem jurídica internacional: princípio da prevenção; princípio do desenvolvimento sustentável; princípio da eficiência económica e princípio do poluidor-pagador.
Saliente-se, que estes princípios tem o valor de tarefa constitucional e recaem sob o legislador, sob a Administração Pública, que tem o dever de não violar os referidos princípios, sob pena de ilegalidade das suas decisões e por último sob os juízes, que devem reconstruir o direito em função da Constituição e não se descuidando da tutela do direito ambiental, embora sejam órgãos independentes e irresponsáveis, estão sempre vinculados à Constituição.É importante dizer, que estes princípios específicos do Direito em análise não afastam os princípios gerais da actividade administrativa.
Assim, após o breve enquadramento dogmático do princípio da prevenção, cabe reflectir e explicitar em que consiste o enunciado princípio bem como o seu respectivo fundamento e se realmente, faz sentido ou não, uma repartição estanque entre princípio da prevenção e princípio da precaução.
Desta forma, cumpre dizer que o princípio da prevenção não é específico do Direito do Ambiente uma vez que, também tem repercussões noutras áreas como é o exemplo do urbanismo, consumo público, entre outras. Trata-se, essencialmente, de um princípio de bom senso que é, posteriormente, transformado num conceito de natureza jurídica, que assenta numa lógica “mais vale prevenir do que remediar”.
De facto, ao Homem cabe preservar os recursos ambientais em nome das gerações presentes como futuras, até por força do princípio do desenvolvimento sustentável e do princípio da solidariedade intergeracional, pois é melhor antecipar danos que podem revelar-se a posteriori catastróficos.
Deste modo, o princípio da prevenção, é entendido por VASCO PEREIRA da SILVA, como uma regra de conduta que visa antecipar a existência de lesões que podem ter origem no fenómeno da natureza ou resultante da actividade humana, abarcando prejuízos e riscos e implicando um juízo que deve ser feito com base na imediatez e nas suas consequências futuras (juízos de prognose). Daí, ser forçoso concluir-se, que o autor adopta uma noção ampla, afastando-se da autonomização do princípio da precaução, que tem sido defendida na doutrina e acolhida no Direito Internacional Público, especificamente na Declaração do Rio de 1992.
Efectivamente, as grandes diferenças apresentadas pela doutrina entre o princípio da prevenção e o princípio da precaução são: a prevenção compreende perigos concretos, paralelamente, a precaução compreende riscos e a prevenção diz respeito a actividades com carácter actual e, paralelamente, a precaução diz respeito a actividades com carácter prospectivo. Note-se que, além disso, a prevenção tradicional lida com a probabilidade e a precaução vai além, na estrita medida em que, cobre a mera possibilidade, sem a base de certeza científica.
Consequentemente, a regência esbate a diferença entre a prevenção e a precaução invocando três argumentos:
O primeiro argumento é o linguístico uma vez que, a base desta distinção não faz qualquer sentido; logo alternativamente é preferível aprofundar o carácter de prevenção incluindo acontecimentos naturais como condutas humanas susceptíveis de lesar o meio-ambiente, sejam elas actuais ou futuras.
O segundo argumento é o material, chamando à atenção que as causas humanas e as causas da natureza entrelaçam-se, não sendo possível fazer uma repartição nítida, o mesmo se constatando na distinção entre perigos e riscos. A separação entre reacção imediata e reacção duradoura, como é defendida pelos autores anglo-saxónicos, também não é viável na medida em que, é imperioso proceder à realização de juízos de prognose para considerar a reacção imediata e duradoura conjuntamente.
A demais, é introduzido pelo princípio da precaução a inversão do ónus da prova, ou seja, exige-se que o presumível agente agressor do meio ambiente faça prova da inocuidade da sua intervenção o que coloca, desde logo, dois problemas fulcrais: por um lado, existe uma crença excessiva na realidade científica, todavia, é necessário referir, que não existem provas irrefutáveis na ciência devido ao dinamismo do conhecimento científico que tem como consequência, a sua instabilidade e a sua impossibilidade de certeza; por outro lado, todas as medidas ambientais têm repercussões na sociedade e isto porque, todas elas implicam uma valoração,logo é sempre necessário ponderar custos e benefícios.
O terceiro argumento é a técnica jurídica, visto haver uma consagração constitucional do princípio da prevenção (artigo 66º, nº 2 CRP).
Neste contexto, é interessante mencionar que CARLA AMADO GOMES, também perfilha da opinião de VASCO PEREIRA da SILVA afirmando que o princípio da precaução é um aprofundamento do princípio da prevenção temperado pelo princípio da proporcionalidade em função da ponderação entre aquilo que se protege e a forma como se protege e, consequentemente, este aprofundamento trouxe deveres perante a realidade ambiental como deveres de informação, deveres de periódica revisibilidade dos dados científicos, deveres de adopção de medidas preventivas, deveres de comunicação de acidentes, entre outros.
Em suma, no Direito Interno o princípio da prevenção deve ser entendido em termos amplos por força da argumentação supra referida, ao contrário do que sucede no Direito Europeu e Internacional, porque caso autonomizássemos o princípio da precaução iria observar-se uma hipervalorização dos valores ambientais em detrimento de um desenvolvimento económico e social.