Atendendo ao Acórdão em análise, comece por dizer-se que o Tribuinal Constitucional delimitou o objecto do recurso à fiscalização da constitucionalidade do artigo 10.º da Lei 65/93, de 26 de Agosto e do artigo 13.º/1 do Decreto-Lei 321/95, de 28 de Novembro. Assim sendo, estamos perante um conflito entre um direito ao acesso ambiental dos arquivos e registos administrativos e o direito à reserva e ao segredo que a lei institui como forma de tutela dos direitos de propriedade privada e livre iniciativa.
O que sucede neste caso é a tentativa de acesso de uma Organização Ambientalista em aceder a informações acerca de um contrato entre o Estado português e um particular (pessoa colectiva). Importa, neste âmbito, referir a Lei 35/98 que estipula que as organizações não governamentais do ambiente constituem um dos sujeitos das relações jurídico ambientais, detendo, assim, legitimidade para intervir judicialmente em matéria de Direito ambiental.
O Direito de acesso à informação ambiental tem consagração constitucional no art. 268º/1/2 da CRP. Da sua redação pode retirar-se uma dimensão subjectiva e outra objectiva. A primeira respeita à importância que o acesso à informação tem para que o cidadão possa compreender os limites dos seus direitos em face dos poderes públicos; a segunda assenta no facto de permitir controlar a transparência da decisão administrativa.
O direito de propriedade e de iniciativa privada, juntamente com o inerente segredo industrial e comercial surge no art. 10º da Lei 65/93, permitindo que as informações ambientais sejam recusadas quando confrontadas com este direito. A recorrente alega a inconstitucionalidade deste preceito, argumentando que extravasa o âmbito da restrição prevista no art. 268/2 da CRP concluindo pela prevalência do direito à informação que considera por em causa a defesa da vida, integridade física e moral e, ainda, a segurança, na medida em que o direito à informação permite a defesa do Direito do Ambiente de forma preventiva. Citando um argumento da Prof. Carla Amado Gomes, “o ambiente induz solidariedade entre os membros no sentido da prevenção de condutas lesivas de bens essencialmente frágeis e fundamentais ao equilíbrio do ecossistema.” Daqui pode retirar-se que o Direito do ambiente assenta em condutas essencialmente preventivas.
Perante este conflito de interesses, o Tribunal optou pela restrição ao direito da informação, fazendo actuar o art. 268º/1/2 da CRP em conjugação com o art. 18º da CRP. Em boa verdade, este último impõe necessárias cautelas às leis restritivas, nomeadamente através do princípio da necessidade, da proporcionalidade e da adequação. Tal como se refere no Acórdão em apreço, não se trata de um conflito hierárquico, pois os direitos em causa são ambos direitos fundamentais, o que significa que devemos fazer uma ponderação casuística da situação. Contudo, o Tribunal não parece ter sido meticuloso com a ponderação exigida, na medida em que se deu prevalência geral e absoluta ao sigilo das informações da hipótese em causa, devendo antes ter sido feita uma análise a cada documento de per si e não uma ponderação geral. Assim, devia ter sido identificado com exactidão o quê e em que medida devia ter sido omitido, por se considerar sigiloso, e, por sua vez, o que devia ter sido revelado, por caber dentro do âmbito do direito à informação.
Pelo exposto deve concluir-se que a recusa absoluta de acesso aos documentos representa um sacrifício total do acesso à informação, pelo que se discorda da decisão proferida pelo Tribunal Constitucional por inobservância dos critérios imperativos constantes no art. 18º/2 da CRP.
Cláudia Cordeiro, nº14600