sexta-feira, 24 de abril de 2009

AIAP Vs. AIAE

O âmbito desta análise visará a diferenciação entre dois procedimentos administrativos especiais, produzindo efeitos para o futuro e sendo condição de validade dos actos seguintes, ambos introduzidos em virtude de directivas comunitárias, como não podia deixar de ser, nesta matéria visto que a nossa legislação tende a ser apática.
Em ambos os casos está em análise o impacto ambiental de determinada acção humana, através da identificação, descrição e avaliação dos efeitos potencialmente nefastos, ou benéficos, antes que essa seja aprovada. Deverão ser realizadas consultas, analisados os resultados e daí retirar-se uma conclusão face ao impacto ambiental.
Estamos perante, como é de se ver, mais uma das muitas manifestações dos princípios ambientais, em especifico o da prevenção. Recordemos, sucintamente e sem entrar em detalhe na discussão de fundo, que o principio da prevenção visa prever e evitar riscos para o meio ambiente.

Como distingui-los? O ponto de partida será as definições e âmbitos legais que surgem nos próprios diplomas e é neste aspecto que incidirá a nossa análise.

Por um lado, temos o Decreto-Lei 69/2000, alterado pelo Decreto-Lei 197/2005, que estabelece o regime de Avaliação do Impacto Ambiental de Projectos (AIAP) e, por outro, o Decreto-Lei 232/2007 que cria o regime de Avaliação de Impacto Ambiental Estratégica (AIAE).

Quanto ao regime AIAP, retiramos do artigo 1º que este incidirá, sobretudo, em projectos públicos e privados. Para sabermos o que se entender por projecto, devemos atender ao artigo 2 alínea O) que nos refere que um projecto é uma “concepção e realização de obras de construção ou de outras intervenções no meio natural ou na paisagem, incluindo as intervenções destinadas à exploração de recursos naturais”. Quanto aos projectos que estão sujeitos a AIAP, o artigo 1º desenrola-se num algo complexa elenco que deve ser analisado conjuntamente com os vários anexos ao diploma. Primeiro devemos verificar se o projecto é tipificado no anexo I, de acordo com o artigo 1 nº3 alínea A). Se for, deve haver avaliação, se não, deve verificar-se se consta do anexo II (alínea B). Se constar do anexo II, e for Caso Geral ou Área Sensível, haverá AIAP, se não, segue-se o regime do artigo 1 nº4, que remete para o anexo V, para verificar se tem impacto significativo, implicando AIAP. Caso não se enquadre em nenhum destes regimes, há ainda a possibilidade de haver Avaliação nos termos do artigo 1 nº5, por decisão casuística do governo. Sem querer entrar muito ao nível do procedimento indico somente os pormenores de maior relevo, nomeadamente que há uma forte componente publica, sendo requisito que haja participação publica (artigo 15) e que pode haver dispensa de AIAP (Artigo 3). No que toca à dispensa, não se deve entender como uma dispensa no todo em parte da AIAP, mas sim, através de uma interpretação com o artigo 3 nº7, uma dispensa com determinadas condicionantes. Ultima nota para referir que o AIAP não é uma análise prévia e estanque, havendo mesmo avaliações posteriores, nos termos do artigo 27 e seguintes.

Debrucemo-nos um pouco sobre o regime de AIAE. Retiramos do artigo 3º que, diferentemente do AIAP, esta avaliação ambiental incide sobre planos e programas. Parece-nos que deste modo fica um regime por ventura demasiado abrangente. O que são os planos e programas? Apesar de serem formalmente aprovados como regulamentos, existe discussão doutrinária quanto à sua natureza dos planos como regulamentos, actos administrativos ou uma eventual terceira via. Não aprofundaremos aqui o tema por não ser o local devido, mas fica a nota de que os planos determinam áreas de protecção, de construção (ius edificandi), etc. O artigo 2 alínea B) dá-nos uma noção complementar de planos e programas sobre os quais irá incidir a avaliação estratégica. Retiramos ainda deste regime, nomeadamente do artigo 13, a introdução do princípio do aproveitamento dos actos que, em caso de AIAE e AIAP, permite que se evite uma dupla avaliação de impacto integral, correndo ambos em simultâneo. É normal que coincidam os âmbitos, pode um projecto ser construído numa área de um plano, por exemplo uma estrada ser construída num PDM, pelo que é importante este aproveitamento dos actos. Veja-se a este propósito o artigo 13 nº4.

Do exposto constatamos que ambos visam o mesmo objectivo que passa pela análise do impacto de ambiental, estabelecendo-se a principal diferença pelo âmbito de cada análise. De um lado o AIAP, incidindo sobre projectos, do outro o AIAE, assente em planos e projectos. Apesar desse âmbito diferente, aproveita-se actos comuns de modo a não haver desperdício de fundos e tempo. Será eventualmente o caso da consulta pública, requisito essencial de ambos os procedimentos.
Para concluir esta análise, parece-me pertinente a critica ao sistema de AIAP. Uma observação do regime leva-nos a concluir que se estabelece um aparente exigente regime tendente a um mecanismo moroso e que, eventualmente, poderá ser de fácil dispensa, nomeadamente por interesse nacional. Surge ainda um pormenor que nos merece a maior reserva, isto é, o problema do deferimento tácito, altamente contraproducente face às exigências de protecção ambiental que deveriam estar inerentes ao regime em causa. A melhor solução, seguindo o entendimento de Vasco Pereira da Silva, será a que estabelece uma simplificação do regime, de modo a tornar-se mais célere, mas que seja sempre obrigatório.